| We die alone but we live among men. | |
John MarstonNo
início havia
John Ford com
The Searchers e
John Wayne, onde o pistoleiro era um herói por força
do seu elevado sentido de justiça com roupa lavada e engomada. Depois
veio
Sergio Leone com
Il buono, il bruto, il
cattivo (
O bom, o mau e o vilão) e
Clint
Eastwood, marcando para sempre a imagem do cowboy como um
homem marginal, reservado e de barba rafeira com um cigarro no canto da
boca, num mundo sem lei e com um código moral ambíguo.
A
Rockstar leva-nos com
Red Dead
Redemption de volta ao início do século XX, uma altura
crucial na construção da sociedade ocidental como a conhecemos hoje. É a
altura em que o sonho americano original morre e se transforma,
passando da ambição de ter uma porção de terra onde cultivar e criar a
nossa família para ter um trabalho de colarinho branco e enriquecer sem
limites. É nesta altura em que o Oeste ainda está por domar, quando as
vastas planícies ainda selvagens se estendem até ao sol posto no
horizonte.
É este mundo que a
Rockstar San Diego se propõe a recriar com
Red
Dead Redemption, um mundo nos seus últimos
momentos onde o avanço tecnológico e o Governo Federal se impõem. Como
não poderia deixar de ser, este mundo chega-nos com todas as
características de um jogo da
Rockstar: um mundo
aberto, personagens únicos, acção viciante e uma narrativa exemplar.
Somos
John Marston, um fora-da-lei reformado que, muito ao
jeito da
Rockstar, é obrigado pelo Governo Federal a
caçar o seu antigo grupo agora encabeçado por
Bill Williamson de forma a salvar a sua família. É sob esta premissa que vamos viajar
por um mundo aberto, em grande parte inabitado, duro e cruel com os
poucos que nele vivem. O mundo de
Red
Dead Redemption divide-se em três regiões
distintas:
West Elizabeth,
New Austin e
Nuevo Paraiso.
New Elizabeth é
a região mais a Noreste no mapa e onde a tecnologia e a modernidade já
se instalaram.
New Austin é a região central e
fronteiriça com o México, com longas pradarias e bosques, o típico
cenário de um
western.
Nuevo Paraiso é a
região revoltada além fronteira, mergulhada em guerra civil.
Enquanto
New Elizabeth não nos espanta com as suas medidas, as regiões
de
New Austin e
Nuevo Paraiso são
espantosamente extensas com pequenos entrepostos e cidades aqui e ali. A
dimensão do mundo é ainda mais estonteante devido ao nível de pormenor.
Cada região é diferente com zonas distintas dentro das suas fronteiras,
em grande parte devido ao ecossistema fenomenal encontrado em
Red
Dead Redemption.
Com mais de 30 espécies
diferentes de animais desde pássaros, equídeos, roedores e carnívoros,
presas e predadores, o céu, as planícies, montanhas e vales estão
preenchidos com vida natural que, felizmente, se comporta de forma
natural. Lobos andam em alcateia quando caçam coelhos ou homens
perdidos, abutres voam em círculos sobre carcaças putrefactas e veados
cobrem os campos aos saltos. A flora também se destaca de região para
região com diferentes tipos de árvores e plantas, incluindo os icónicos
cactos e
tumbleweeds.
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Passando
para os humanos, estes também têm as suas idiossincrasias regionais,
desde o
snob nortenho de
West Elizabeth, ao
rebelde de
Nuevo Paraiso sem qualquer noção de higiene,
passando pelos bandidos e rancheiros de
New Austin. Ao
estilo dos
Western Spaghetti,
Red
Dead Redemption recorre a esterótipos como a
mulher forte e decidida, o mexicano preguiçoso, o irlandês bêbado, o
bom, o mau e o vilão.
A
presença humana funciona à semelhança do ecossistema, com regras
próprias de comportamento que desencadeiam eventos aleatórios como um
bando de foras-da-lei a assaltar um rancho, uma prostituta a ser
violentada por um cliente ou um enforcamento no meio de nenhures. Os
habitantes em
Red
Dead Redemption mostram uma autonomia e carácter
próprios e o mundo existe sem o nosso impulso, algo extremamente agrável
de testemunhar.
A juntar a esta naturalidade no comportamento
dos habitantes temos um extenso leque de actividades suplementares como
poker,
uma espécie de jogo da malha com ferraduras e outras menos lúdicas,
como caçar bandidos com a cabeça a prémio ou ser desafiado para um
duelo. Estas são apenas algumas das actividades em que podemos
participar, havendo muitas mais espalhadas pelo mapa. O mundo de
Red
Dead Redemption nunca se torna enfadonho nem
gasto.
Falando
agora do grande elefante na sala,
Red
Dead Redemption tem óbvias parecenças com
GTA
4. A estrutura é familiar, ícones aparecem no radar a
indicar-nos as próximas missões, pessoas do mundo pedem-nos ajuda e
iniciamos missões paralelas ao desenvolvimento da história, sem que
alguma destas nos seja imposta.
O motor de jogo é o de
GTA
4 com melhorias e ajustes ao armamento e "veículos", de modo
que controlar
Marston lembrar-vos-á os dias em que
controlavam
Niko Bellic em
Liberty City.
O sistema de cobertura, a mira e os movimentos são semelhantes mas,
como disse, melhorados e adaptados ao tema. No entanto, as parecenças
entre os dois títulos não conferem o estatuto de cópia a
Red
Dead Redemption mas chegam-nos como herança dos
jogos de mundo aberto da
Rockstar.
A
grande melhoria no motor foi a de localização de impacto. Em
Red
Dead Redemption conseguimos alvejar um pé, uma
mão, um joelho, um ombro, sem matar o nosso alvo. Isto abre
possibilidades para verdadeiros momentos do cinema como desarmar vilões e
tirar-lhes o chapéu. Inclusivamente, se num duelo conseguirmos vencer o
nosso adversário sem o matarmos ganhamos o dobro da fama.
Para
distinguir o título de 2008 deste de 2010,
Red
Dead Redemption aposta nas particularidades que
advêm do mundo que recria, apoiando-se particularmente em três elementos
de
gameplay.
O
primeiro é o meio de transporte. Numa altura em que o automóvel é um
luxo raro, quase exótico, o cavalo é o nosso fiel companheiro e veículo.
Embora não estejam ao nível de
Agro de
Shadow
of the Colossus, os equídeos, assim como todos os animais do
mundo, estão muito bem feitos e credíveis enquanto criaturas vivas e
selvagens. Quem não quiser atravessar o vasto mapa poderá sempre montar o
acampamento e viajar automaticamente para certos pontos do mundo,
embora perca uma grande parte da experiência que é
Red
Dead Redemption. Fica o aviso que nem todos os
cavalos são iguais, havendo uns mais fortes e rápidos que outros.
O
segundo elemento que separa
Red
Dead Redemption de
GTA é o
arsenal, em especial o
lasso, uma ferramenta não letal e
multiusos. Desde caçar e domar cavalos a amarrar bandidos foragidos e
devolvê-los às autoridades (ou deixá-lo na linha do comboio como forma
de justiça própria), o
lasso é uma ferramenta útil e única.
O
terceiro é o
Dead Eye, uma espécie de
Bullet
Time à la Matrix em que o tempo
abranda e nós podemos apontar com maior precisão os nossos alvos. Com
três níveis distintos, o
Dead Eye começa por apenas
abrandar o tempo, chegando a permitir escolher os alvos e o local exacto
onde queremos acertar. Esta capacidade faz com que consigamos tirar o
chapéu aos nossos inimigos e os desarmemos ao estilo de
Clint
Eastwood. O
Dead Eye, em conjunto com o
lasso,
torna-se uma das marcas mais identitárias de
Red
Dead Redemption.
Outros elemento, embora
não de
gameplay, são o sistema de fama e honra e a lei. Cada
relação que
Marston tem com os habitantes dá-lhe fama
mas dependendo das suas
acções,
pode aumentar ou diminuir a sua honra. Enquanto a fama acrescida
chamará a atenção de pistoleiros que querem ser reconhecidos e nos
desafiam para um duelo, a honra molda a opinião que os habitantes têm de
nós, condicionando as suas acções e reacções perante a nossa presença.
Se usarmos um lenço quando nos quisermos portar menos bem, a fama
aumentará mas a honra permanecerá intacta.
Em relação à lei, em
Red
Dead Redemption esta é persistente, ao contrário do que
vemos em
GTA 4. Se roubarmos, matarmos ou importunarmos
as pessoas erradas poderemos ficar com a cabeça a prémio, prémio que
aumentará até o pagarmos. Entretanto, dependendo da seriedade do delito,
teremos grupos de homens da lei e caçadores de prémios nos nossos
calcanhares.
Visualmente,
o jogo está impecável. As texturas estão praticamente palpáveis e os
efeitos de luz exemplares, exibindo o seu explendor quando à noite
nuvens carregadas cobrem o céu e relâmpagos iluminam os campos. Os
animais deixam pó quando correm, as armas deitam fumo quando disparadas e
os cavalos têm um nível de detalhe e pormenor assustador com os
músculos contraíndo e descontraíndo conforme os seus movimentos. Todas
as armas que
Marston carrega estão visíveis no avatar e
os diferentes fatos estão maravilhosamente desenhados e animados.
Red
Dead Redemption mostra ao mundo como se conta uma
história com personagens virtuais.
John Marston,
Marshal
Leigh Johnson,
Bonnie MacFarlane, entre
muitos outros que entram neste título, são das personagens virtuais mais
credíveis, vivas e únicas.
John Marston em particular
não é o homem ideal, não é culto, embora alfabetizado, mas esperto e
experiente. O facto de ser um homem com falhas torna-o mais humano,
ajudando à aproximação do jogador.
Por
melhor que sejam as partes cinemáticas com as posturas, poses e
expressões naturais dos personagens, há que destacar a prestação sonora.
As vozes fiéis aos modelos dão vida aos diálogos não menos que geniais
que recorrem à gíria da altura e jeitos regionais da língua.
Red
Dead Redemption leva-nos até um mundo de gente
fora-da-lei, sem maneiras, moldada pela ignorância e violência dos
tempos e o seu comportamento e linguagem não o escondem.
A banda
sonora marca presença com a mais alta qualidade, consoante a situação em
que nos encontramos, dado não haver rádio incorporado nos cavalos. Os
instrumentais compostos por
Bill Elm e
Woody
Jackson, com inspirações claras nalgumas faixas de
Ennio
Morricone, compositor dos filmes de
Sergio Leone de 64 a 75, com a harmónica, o violino, o banjo e o assobio a marcarem
presença, misturam-se com as paisagens magníficas.
José Gonzalez também dá o seu contributo com uma faixa cantada, intitulada
Far Away.
Os
sons do mundo não ficam atrás. Todos os animais têm a sua "voz"
característica, o som dos cascos muda consoante o terreno e se está seco
ou molhado. As armas têm um som que respeita o original, fazendo com
que um revólver soe a um revólver e não a uma 9mms. As emoções nas vozes
dos transeuntes levam-nos a perceber a situação em que se encontram,
ajudando os jogadores a entrarem e, mais importante ainda, a acreditarem
no mundo de
Red
Dead Redemption.
Cliquem aqui para ver os vídeos de Red Dead Redemption
|
No
modo
multiplayer a
Rockstar mostrou que
aprendeu com os erros e ganhou experiência. O modo online por defeito é
Free
Roam, onde até 16 de jogadores por sessão podem explorar,
salvar
ou condenar o mesmo mundo presente na campanha. Neste modo podemos
formar grupos e completar certos desafios contra ou favor da lei. À
medida que completamos desafios no
Free Roam e somamos
jogos nos modos competitivos ganhamos experiência e subimos de nível. No
entanto, é neste modo onde mais notamos o nosso progresso, passando
literalmente de burro para cavalo, passando por uma pileca pelo meio.
Armas mais poderosas e novos avatares são outras recompensas que nos
chegam com a subida de nível.
Para os que se assustam com grandes
viagens fica o aviso que neste modo
Free Roam não
podemos acampar como no modo
singleplayer mas temos entrepostos
que nos permitem viajar instantaneamente para outras regiões e
localidades.
Os
modos competitivos são variantes de
Deathmatch e
Capture
the Flag em equipa ou em
free for all. A cereja no
topo do bolo é a forma como estes modos começam - com um duelo. Os
jogadores começam frente a frente com a arma apontada a quem desejarem
até que é dada a ordem de tiro. No final só poderá haver um de pé que
ganhará vantagem sobre os restantes.
Shootout e
Gang
Shootout não têm muito para explicar, são encarnações dos
modos tradicionais
Deathmatch e
Team Deathmatch no mundo de
Red Dead Redemption.
Hold Your Own por sua vez apresenta o conceito de
Capture the Flag só que com sacos de ouro. Enquanto nos modos
Shootout e
Gang Shootout os mapas não são muito grandes, em
Hold
Your Own somos encorajados a usar cavalos para infiltrarmo-nos
na base inimiga e escapar com o saco sem que sejamos atingidos por
snipers,
gatling guns ou canhões.
Gold
Rush é o modo, entre os competitivos, que mais se apresenta
como original. Novamente com a possibilidade de ser jogado em equipa ou
todos contra todos, o objectivo é recolher sacos de ouro que
aleatoriamente surgem no mapa e devolvê-los ao nosso baú. Cada jogador
pode carregar até dois sacos de cada vez mas cada saco diminui a
mobilidade de quem os carrega, tornando-o vulnerável a ataques e
consequente roubo.
Red
Dead Redemption tem mais do que o necessário para
nos manter ocupados durante meses a fio. A campanha
singleplayer tem cerca de 20 horas sem contar com a exploração inevitável e tem
ainda uma componente
multiplayer bastante sólida e apelativa
que irá crescer a partir de Junho com
DLC.
Fica
a nota de que
Red
Dead Redemption não será para todos. Enquanto não
duvido que todos os fãs de
GTA gostarão da história
fantástica que a
Rockstar apresenta com este título, a
exploração não agradará aos mais impacientes e àqueles que não são dados
à aventura sem destino. Informo desde já que a exploração é uma das
características que faz de
Red
Dead Redemption um colosso entre os jogos de mundo
aberto.
Passadas 7 horas desde o momento em que controlei pela
primeira vez
John Marston avancei bastante menos do que
se me tivesse focado nas missões, isto porque dei por mim desviado do
meu
caminho
original uma e outra vez. O mundo não está cheio de acontecimentos
aleatórios, havendo momentos em que nos encontramos sozinhos no meio do
nada. Os animais não preenchem constantemente o ecrã nem vemos um homem a
ser enforcado a cada cinco minutos. Todavia, é esta naturalidade que dá
credibilidade ao mundo de
Red
Dead Redemption. Encontrarmo-nos sozinhos na
pradaria deixa-nos maravilhados até sermos atacados por uma alcateia ou
um puma que nos desfazem em segundos.
Não só belo, o velho
oeste é cruel e violento - a história de
Marston mostra-nos isso mesmo - mas a liberdade imensa e os tons de cinzento que
ligam o bem e o mal fazem-nos voltar a montar o cavalo, a cobrir a
cabeça com o velho Stetson e a descansar o revólver no coldre.
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Liberdade
é a palavra chave em
Red
Dead Redemption, de mão em mão com realismo. O
ecossistema, o universo social e a perícia e experiência da
Rockstar em criar mundos, fazem deste o mais vivo e verosímil, na minha opinião,
até ao momento. Mesmo com os
bugs relatados que, felizmente,
não testemunhei na primeira pessoa,
Red
Dead Redemption é o jogo de eleição para quem
sempre fantasiou com o faroeste, em correr as planícies e bosques e
impor a sua justiça num mundo que precisa desesperadamente de uma
bússola moral.
96/100Fonte : MyGames.pt